Se
vc é uma pessoa que sofre ao enxergar o lado cruel da humanidade, não leia este
artigo. Se imagens reais do que os homens são capazes de fazer com as mulheres
podem ferir sua sensibilidade, pare a leitura aqui e num clique esqueça esse
assunto.
Se
vc continuou então devo esclarecer que minha intenção é bem clara: pedir que vc
pense e me responda às seguintes perguntas:
-
o que permite, ou alimenta, um ser
humano cometer este tipo de crime que vou descrever no seguinte artigo?
- que
tipo de sociedade “permite” a recorrência desse crime?
Não
responda imediatamente e nem dê respostas comuns; investigue na sua alma, no
silêncio da sua reflexão, no âmago da sua crença, busque na semelhança que
existe entre vc (um ser humano) e um desses criminosos (outro ser humano), sem
julgá-lo, o que sente uma pessoa dessas que a leva a um crime desses. E
ampliando a atitude desse criminoso me responda por que a sociedade sustenta
esse comportamento.
Vamos
aos fatos.
As
atrocidades contra a mulher ao redor do mundo são muito conhecidas por todos
nós. Sabemos que 1/3 da população feminina mundial é ou já foi espancada ou
agredida sexualmente; 1/3 da população feminina mundial! A violência doméstica
(que também recai sobre crianças) é um fato e um crime tão recorrente que tem
gerado a imposição de leis para proteção das mulheres. Em todos os lugares em
que esse tipo de violência é comum a estatística revela que o crime contra a
mulher acontece principalmente dentro da “sagrada família”, dentro de casa
sendo os criminosos pais, maridos, irmãos, tios, namorados ou ex-parceiros,
apoiados pelas famílias e pela sociedade, que colabora na hora de atirar as
pedras, sejam reais ou metafóricas, conforme a cultura.
Crimes
contra a mulher sempre ocorreram em larga escala (não dizem que no tempo das
cavernas o homem puxava a mulher pelos cabelos, como fazem hoje na China?),
e,
muito recentemente, quando os índices tornaram-se assustadores, e a situação
ficou culturalmente vergonhosa, mas principalmente porque as mulheres
tornaram-se ativistas, que alguns procedimentos de defesa foram sendo
implantados. Em alguns países essas leis têm funcionado melhor (a Lei Maria da
Penha virou um modelo internacional), em outros não tem funcionado e em vários
ainda nem existe esse tipo de lei. E onde as leis não funcionam, já sabemos, o
crime corre solto.
Alguns
estudos indicam que 90% das mulheres do
Paquistão são vítimas de violência doméstica; 66% no Irão são agredidas
no início do casamento; na Jordânia 60% das mulheres acham
que os maridos lhes devem bater quando elas queimam o jantar; na Turquia 50% das mulheres são agredidas física e sexualmente com
regularidade; na África do Sul a cada 27
segundos
uma mulher é estuprada. No Brasil 60% das mulheres que
solicitaram ajuda afirmaram serem espancadas diariamente, sendo que a cada 15 segundos uma mulher é espancada... sendo a
violência doméstica a causa morte de 70% das brasileiras.
Câncer de mama vai virar opção sortuda!!
A
diferença entre as atrocidades cometidas varia conforme a cultura e as “facilidades”
para a ocorrência dos crimes, não sendo umas modalidades piores do que as
outras, mas neste artigo vamos destacar uma delas. Dentre as várias e incríveis
modalidades de crimes contra a mulher, há muitos anos um tipo de crime vem se
repetindo na África e no sul da Ásia, com maior destaque midiático no
Paquistão: mulheres são atacadas e deformadas com ácidos nítrico e sulfúrico (acid attack).
A
recorrência é tão significativa que o governo paquistanês foi obrigado a
modificar a legislação passando de 5 para 14 anos a pena para o crime, mas fora
Bangladesh que impôs controles para a venda dos ácidos, o produto é facilmente
encontrado e comprado em qualquer região destes continentes. Além da facilidade
de acesso à “arma” apenas 2% dos casos chegam a julgamento e os criminosos não
permanecem mais que 1 ano presos; o que significa que o governo praticamente
INCENTIVA a prática.
Ativistas
indicam que cerca de 150 mulheres por ano são atacadas e vem aumentando mesmo
depois da mudança da legislação. Em 2008 o documentário “Saving Faces”, que
conta o trabalho do cirurgião plástico paquistanês, Mohammad Jawad,
reconstruindo os rostos das vítimas desse tipo de ataque, revelou para o mundo
as imagens dessa realidade que parece fictícia ou casual, de tão absurda.
O
documentário ganhou Oscar, mas os ataques só aumentam. Uma organização formada
por cirurgiões plásticos da Itália viajam trimestralmente às regiões mais
afetadas para realização das cirurgias e tentativa de amenização do sofrimento
dessas mulheres.
A
incidência de tal violência e a terrível conseqüência são tão preocupantes que
o crime está sendo observado numa nova
categoria de terrorismo: o terrorismo pessoal. A Associação de Mulheres
Progressistas do Paquistão desde 1994 registrou 7.800 casos de mulheres que
foram deliberadamente queimadas, escaldadas ou sujeitas a ataques de ácidos,
apenas na área de Islamabad, sua capital.
As
informações são terríveis, mas não conseguem provocar a angústia que sentimos
ao ver as imagens dessas mulheres; seus rostos dizem muito mais do que qualquer
informação, suas marcas nos fazem sofrer e pensar: quem somos? Sim, “quem somos”
porque se olharmos para estes rostos com piedade, nos afastamos do problema; com
medo de ficarmos chocados e sofrermos sentimos pena como se essas vítimas não
fossem nós mesmos; como se esses criminosos pertencessem a outro planeta, a uma
cultura tão distante que não se assemelha em nada com a nossa. Mas elimine essa
ilusão e se solidarize com essas marcas porque esse tipo de terrorismo só muda de arma, mas se repete entre todos nós.
Se vc sente terror ao ver essas imagens, imagine o que sente cada uma dessas
mulheres ao se olharem no espelho e verem que este “terror” está cravado no
próprio rosto. As fotos foram tiradas por Nicholas Kristof, na ocasião enviado
pelo New York Times.
Irum
Saeed, 30, posa para a fotografia em seu escritório na Universidade Urdu de
Islamabad, Paquistão, quinta feira 24 de julho de 2008. Irum foi queimada no
rosto, costas e ombro há 12 anos, quando tinha 17, quando um rapaz a quem ela
rejeitou o casamento a seguiu até a escola, a cercou numa rua estreita e jogou um
jarro cheio de ácido sobre ela. Foi submetida a 25 cirurgias plásticas.
Shameem
Akhter, 20, posa em sua casa em Jhang, Paquistão, quarta-feira, 10 de julho de
2008. Shameem foi estuprada por 3 rapazes que, em seguida, jogaram ácido sobre
ela há 3 anos. Passou por 10 cirurgias plásticas.
Najaf
Sultana, 16, posa em sua casa em Lahore, Paquistão, quarta-feira, 09 de julho
de 2008. Na idade de 5 anos ela foi queimada por seu pai enquanto dormia,
aparentemente porque ela não queria ter uma outra menina na família. Najaf
ficou cega e depois de ser abandonada por seus pais, agora vive com parentes.
Já se submeteu a 15 cirurgias plásticas.
Shehnaz
Usman, 36, posa em Lahore, no Paquistão, domingo, 26 de outubro de 2008. Shenaz
foi queimada com ácido por um parente devido a uma disputa familiar há 5 anos.
Já passou por 10 cirurgias plásticas.
Shahnaz
Bibi, 35, posa em Lahore, no Paquistão, domingo, 26 de outubro de 2008. Dez
anos antes ela foi queimada com ácido por parente devido a disputa familiar.
Ela nunca passou por cirurgia plástica.
Kanwal
Kayum, 26, posa em Lahore no Paquistão, domingo, 26 de outubro de 2008. Ela foi
queimada há 1 ano por um rapaz de quem ela rejeitou o casamento. Nunca passou
por cirurgia plástica.
Munira
Asef, 23, posa em Lahore no Paquistão, domingo, 26 de outubro de 2008. Ela foi
queimada há cinco anos por um rapaz a quem ela rejeitou o casamento. Já foi
submetida a 7 cirurgias plásticas.
Bushra
Shari, 39, posa em Lahore, Paquistão, sexta feira, 11 de julho de 2008. Bushra
foi queimada por seu marido há 5 anos porque estava tentando se divorciar dele.
Já foi submetida a 25 cirurgias plásticas.
Memuna
Khan, 21, posa em Karachi, Paquistão, sexta-feira, 19 de dezembro de 2008.
Menuna foi queimada por um grupo de rapazes que jogaram ácido sobre ela para
resolver uma disputa entre sua família e a de Memuna. Já foi submetida a 21
cirurgias plásticas.
Zainab
Bibi, 17, posa em Islamabad, Paquistão, quarta-feira, 24 de dezembro de 2008.
Foi queimada há 5 anos, com então 12, por rejeitar um rapaz para o casamento.
Já se submeteu a várias cirurgias.
Naila
Farhat, 19, posa em Islamabad, Paquistão, quarta-feira, 24 de dezembro de 2008.
Naila foi queimada há 5 anos ao rejeitar um pedido de casamento. O caso de
Naila foi levado à Suprema Corte do Paquistão em novembro de 2008 e recebeu grande
publicidade. O agressor foi condenado a 12 anos de prisão e a pagar 1,2 milhões
de rupees em danos. Isto representou um marco nas decisões de como lidar com a
violência de gêneros, mas não conteve o problema ficando como um caso
excepcional, pois na maioria dos casos quando há punição ela é desproporcional
ao crime.
Saira
Liagat, 26, posa em Lahore, no Paquistão, quarta-feira, 9 de julho de 2008.
Saira casou-se com um parente aos 15 anos mas ambas famílias concordaram que
ela só passaria a viver com o marido quando completasse a escola. O marido no
entanto pediu que ela fosse viver com ela antes do acordado e devido a recusa
ela a atacou com ácido. Já se submeteu a 9 cirurgias plásticas.
Nasreen
Sharif, 26 posa em Islamabad, Paquistão, 24 de junho de 2007. Aos 15 anos
Nasreen foi queimada depois de rejeitar o casamento com um homem muito mais
velho, primo de seu pai. O atacante foi penitenciado a 25 anos de prisão mas com
o suborno de US$ 10.000 conseguiu sua libertação após 3 meses e tornou-se
advogado. Nasrenn ficou cega e tem recebido assistências de organizações
não-governamentais para cirurgias na Itália.
Shama,
jovem mãe de 4 filhos atacada em 2012 pelo marido: “Meu marido e eu sempre
discutíamos em casa, naquele dia, antes de ir dormir, ele disse ‘você tem muito
orgulho da sua beleza’. Então, no meio da noite ele jogou ácido em mim e fugiu”.
O marido levou o celular ao fugir deixando-a sem possibilidade de pedir ajuda.
Grande parte das mulheres que sofrem
este tipo de ataque nunca mais se recupera e comete suicídio.
Aqui
descrevemos apenas os casos relacionados ao ataque por ácidos relatados na
mídia.
Existe
outra enorme lista de casos e fotografias de mulheres que sofreram, e sofrem,
violências com queimaduras à querosene e gasolina, com conseqüências semelhantes
ou piores do que estas. Apenas para citar violências por queimaduras.
As
Nações Unidas e outras organizações de direitos humanos emitiram relatórios
sobre as muitas formas de violência contra as mulheres no Paquistão, envolvendo
violência doméstica, estupro e assassinatos de honra. O ácido é jogado em
mulheres para vingar a vergonha que a mulher é acusada de provocar, seja na
recusa de um casamento, na tentativa de separação matrimonial e outras
circunstâncias. O ácido queima e raramente mata causando desfiguramento grave e
sofrimento que levam as mulheres a se restringirem às suas casas causando
isolamento social e depressão grave. Os crimes são cometidos com facilidade
pois o ácido é utilizado comumente para limpeza e na agricultura; produto
barato e disponível a todos, apesar dos protestos das mulheres contra a venda
livre.
Como
para qualquer crime, com certeza a falta de punição compatível permite o
aumento e ampliação do comportamento.
Misoginia?
= ódio ou desprezo pelo sexo feminino
Machismo?
= crença na inferioridade feminina
Patriarcado?
= ideologia na qual o homem é a maior autoridade devendo as pessoas que não são
identificadas fisicamente com ele serem subordinadas, prestando-lhe obediência.
Há quem diga que teoricamente esses conceitos diferem. Na minha opinião levam ao mesmo resultado.
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